Por Sérgio Pinto Monteiro*
O século XX registra alguns episódios históricos – por vezes trágicos e sinistros – que no Brasil permanecem em quase total desconhecimento, via de regra por ações de grupos esquerdistas, fiéis aos princípios doutrinários de Antonio Gramsci, há décadas dominantes em nosso meio cultural/artístico/midiático. Em artigo anterior retratamos um desses crimes, o HOLODOMOR, quando, entre 1931 e 1933, seis milhões de ucranianos morreram de fome devido ao confisco de toda a produção agrícola e animal do país, ordenada diretamente por Stalin, ditador comunista da União Soviética. No início da Segunda Guerra Mundial, outro crime contra a humanidade, também cometido pela URSS, ficou conhecido como o “MASSACRE DE KATYN”.
Em 1º de Setembro de 1939 a Alemanha invadiu a Polônia, dando início ao conflito que ceifou a vida de mais de 50 milhões de pessoas, entre militares e civis. O pacto de não agressão germânico-soviético, também conhecido como Pacto Molotov-Ribbentrop, assinado pouco antes, previa a ocupação da Polônia e a sua partilha entre ambos os países. A invasão soviética iniciou-se no dia 17 de setembro, quando cerca de 500 mil soldados cruzaram a fronteira leste do país. Enquanto a Alemanha dominava o oeste da Polônia e Hitler determinava a eliminação das “minorias” judias, bem como de dezenas de milhares de poloneses, por conta do racismo antissemita e antieslavo, a União Soviética executava um grande expurgo político em sua área, onde Stalin deportava e matava em nome do socialismo. O chamado Massacre de Katyn ocorreu nesse trágico contexto. Ainda em setembro de 1939, agentes do Comissariado do Povo para Assuntos Internos da União Soviética – NKVD – prenderam, na Polônia oriental, os elementos locais que potencialmente poderiam formar o núcleo principal de uma resistência nacional. Assim, foram detidos pouco mais de 21 mil cidadãos: oficiais da reserva, professores, jornalistas, advogados, médicos e até padres. Foram eles divididos em três campos de concentração: Kozelsk, na Ucrânia, próximo à cidade de Smolensk, e Ostashkov / Starobilsk, localizados na Rússia soviética.
Em 5 de março de 1940, Lavrenti Beria, chefe do NKVD, convenceu o sanguinário ditador da União Soviética que os oficiais aprisionados nesses campos eram membros de grupos contrarrevolucionários e, portanto, representavam um risco para o controle soviético da Polônia. Stalin, então, decidiu condenar à morte TODOS os 21.892 poloneses presos nos três campos de concentração. Os oficiais prisioneiros de Kozelsk – pouco mais de quatro mil – foram sumariamente executados com tiros na nuca, na floresta de Katyn, nos arredores da cidade de Smolensk. Entre os que morreram na floresta de Katyn, estavam um almirante, dois generais, 24 coronéis, 79 tenente-coronéis, 258 majores, 654 capitães, 17 capitães de marinha, 3 420 suboficiais, sete capelães, três fazendeiros, um príncipe, 43 oficiais de forças diversas, 85 soldados, 131 refugiados, 20 professores universitários, 300 médicos, várias centenas de advogados, engenheiros e mais de 100 jornalistas e escritores, assim como 200 pilotos de combate da Força Aérea.
Os demais prisioneiros – cerca de 16 mil – tiveram o mesmo destino trágico e suas ossadas jamais foram encontradas. No total foram executados 21.892 prisioneiros poloneses, a saber: 6.314 oficiais presos em Ostashkov; 3.739 oficiais detidos em Starobilsk; 4.410 oficiais presos em Kozelsk; 7.429 outros cidadãos. Do total de mortos, cerca de 8 mil eram militares, 6 mil policiais e o restante composto por civís integrantes da intelectualidade polonesa.
A NKVD também ordenou a deportação, para o Cazaquistão, das famílias dos oficiais mortos. O Serviço Secreto sabia o endereço de cada prisioneiro e, assim, conseguiu extraditar por volta de 60 mil pessoas. Estima-se, ainda, que a União Soviética deportou 100 mil soldados poloneses para campos de trabalho forçado.
Com o rompimento do pacto de não agressão e o estado de guerra entre Alemanha e União Soviética, os nazistas, em abril de 1943, descobriram as valas com os restos mortais dos quase cinco mil oficiais poloneses assassinados pelos comunistas e denunciaram o Massacre de Katyn. Esses crimes de guerra soviéticos foram objeto, na época, de três comissões de inquérito: uma internacional, chefiada por um médico alemão; outra polonesa, sob os auspícios da Cruz Vermelha; e a terceira comissão, promovida pelos nazistas. As conclusões indicaram que realmente as ossadas datavam de abril de 1940, o que corroborava a suspeita de que os soviéticos seriam os culpados. Estes, por sua vez, ao negarem a autoria dos crimes, realizaram suas próprias análises e investigações, concluindo pela culpabilidade dos nazistas. Tentaram, ainda, os soviéticos – inutilmente – incluir o massacre de Katyn no libelo acusatório do Julgamento de Nuremberg, contra os nazistas. Entretanto, as provas e evidências que responsabilizavam a União Soviética eram por demais conclusivas. Mesmo assim, o país continuou a negar a autoria do massacre até 1990, quando o governo de Mikhail Gorbachev reconheceu oficialmente o episódio. No ano seguinte, Boris Yeltsin tornou públicos os documentos secretos que autorizaram o genocídio. Em novembro de 2010, a Duma, estatal russa aprovou uma declaração culpando Stalin e outros dirigentes soviéticos por haverem, pessoalmente, ordenado os assassinatos, o que foi confirmado pelo Parlamento da Rússia. O filme polonês KATYN, de 2007, disponível no youtube e indicado para o Oscar de melhor produção estrangeira nesse mesmo ano, retrata a crueldade do episódio.
Diversos memoriais sobre o massacre foram erguidos ao redor do mundo. No Reino Unido há dois, em Londres e Staffordshire. Na Rússia há um memorial no Cemitério de Guerra de Katyn, onde estão sepultados os restos de 4412 oficiais poloneses. Em Toronto, no Canadá, há uma grande escultura em metal. Em Joanesburgo, África do Sul, um monumento homenageia os mortos de Katyn. Nos Estados Unidos, em Baltimore, existe o Memorial Nacional do Massacre de Katyn, com uma belíssima estátua dourada. Outras estátuas há em Nova Jersey, Doylestown e Niles. Na Ucrânia, foi erguido um complexo em honra aos 4300 oficiais mortos na cidade de Piatykhatky.
O genocídio praticado pelos comunistas em Katyn – e em tantos outros cenários – além da infâmia que lhe é intrínseca, nos impõe o dever de resgatar a torpe realidade desse fato histórico, ocultado da sociedade brasileira – e principalmente da nossa juventude – por adeptos de uma ideologia nefasta que não se coaduna com os principios e valores da nacionalidade e que deve ser combatida pelos verdadeiros brasileiros.
“O primeiro dever de um historiador é não trair a verdade, não calar a verdade, não ser suspeito de parcialidades ou rancores”. (Cicero, Marcus Tullio, 103aC – 43 aC)
*o autor, 84 anos, é professor, historiador, oficial da reserva do Exército, presidente da Liga da Defesa Nacional- RJ, membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil, da Academia Brasileira de Defesa, do Instituto Histórico de Petrópolis e presidente do Conselho Deliberativo da Associação Nacional dos Veteranos da FEB. É Patrono, fundador e ex-presidente do Conselho Nacional de Oficiais da Reserva. Certos comentários do autor são estritamente pessoais.
Imagem de capa: Instytut Pamieci Narodowejpin.